quarta-feira, junho 16
A B e C
O que temos que encontrar nunca está no sítio onde o procuramos. Lágrimas Negras, encontro do pianista cubano, Bebo Valdez, com Dieguito el Cigala, cantaor , não deve ser procurado na prateleira deserta e poeirenta (por que são todos os desertos poeirentos?) do Flamenco, algures nas traseiras da Música do Mundo, como teimei e quase me perdi (seria mau, perder-me por ali?). Com grafismo luxuosamente discreto assinado pelo estúdio Mariscal, o que não é de somenos, está no top dos mais vendidos é extraordinário. Quer isto dizer que nos atira para fora do ordinário, memso estando entre os mais vendidos, assim e com simplicidade. Primeiro dado, um tem oitenta e tal anos o outro é novo, mas qual deles é o quê neste prazer e entrega? Estão ambos por inteiro, ali compondo mundos. E tocam-nos. Não é estranho interpretarem o amor e o sofrimento, a separação e o desejo com alegria? Estão separados por oceanos, por estilos e temas, mas juntam-se nestas diferenças. Como a imagem gráfica, tudo é bom gosto: alinhamento começa com B & C, com pouco mais, entrando depois em palco um (saxofone) e outro instrumento (violino) até que entra, no final, Caetano Veloso e a poesia do português. Nada nos distrai do essencial, o piano refrescante correndo como rio, dançando em torno da voz que voa, rouca, esforçada e hesitante: cantante. «Meu coração não se cansa/De ter esperança/De um dia ser tudo o que quer» E que tem isto a ver com futebol? Toda a vida tem a ver com a bola. Descobri tarde a metáfora, mas foi a tempo. «Meu coração vagabundo/Quer guardar o mundo/Em mim» Abre-se o chão a meus pés.
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